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quinta-feira, 19 de julho de 2012

EUA: metade da população detinha apenas 1,1% da riqueza em 2010



Metade da população dos Estados Unidos detinha em 2010 apenas 1,1% da riqueza do país, segundo um relatório do Centro de Pesquisas do Congresso (CRS) divulgado na Internet nesta quinta-feira, que mostra um aumento das desigualdades no país.

A degradação das condições da população menos favorecida do país é patente quando se observa a queda entre 2007 e 2010, já que o número passou de 2,5% do patrimônio nas mãos da metade mais pobre para 1,1%. Em 2001, o número era de 2,8%, segundo esta "análise da distribuição da riqueza entre as famílias de 1989 a 2010".
Neste período, o ano de menor desigualdade foi 1995, quando a metade da população chegou a ter 3,6% do patrimônio, contra 3,0% em 1989, ano do início do registro.
O relatório também confirma que, desde 2001, quando o presidente George W. Bush assumiu a presidência, a faixa mais rica da população enriqueceu ainda mais, passando de 32,7% a 34,5% em 2010. Os 10% mais ricos possuíam 74,5% da riqueza há dois anos.
A recessão de 2008 e a crise contribuíram para aprofundar as desigualdades. Segundo o último relatório do escritório do censo sobre pobreza e salários, a taxa de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza foi de 15,1% em 2010, seu nível mais alto desde 1993, e a renda média não para de cair desde 2007.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Moçambique: Pobreza e analfabetismo impedem desenvolvimento de mulheres



AYAC -Lusa

Chimoio, Moçambique, 09 abr (Lusa) - O analfabetismo e a pobreza ainda impedem a mulher moçambicana de explorar e aproveitar os recursos naturais de que o país dispõe para geração da sua riqueza, considerou a governadora de Manica, centro de Moçambique.

Ana Comoana reiterou que a mulher precisa ser alfabetizada para melhor aproveitar o potencial da terra, rios e recursos minerais que a província, em particular, e o país, em geral, dispõem para que a mulher saia da pobreza.

"Reconhecemos que apesar de todos os esforços empreendidos e avanços alcançados até agora, os desafios são enormes: o analfabetismo e pobreza são obstáculos que nos impedem de avançar com a necessária celeridade", disse à Lusa Ana Comoana, apelando à mulher camponesa, a maioria no país, para apostar no ensino sem importar a idade.

Falando durante a celebração do dia da Mulher este fim de semana, que coincidiu com a comemoração do 41.º aniversário da criação da Organização da Mulher Moçambicana (OMM), ala feminina da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), no poder, aquela governante desafiou a mulher a participar no ensino, sem deixar de lado os trabalhos da machamba (quinta), para abastecer o país.

"Nas sociedades em desenvolvimento, as economias são basicamente agrárias, não sendo Moçambique uma exceção, e por ironia do destino são as mulheres que constituem o grosso daquelas que trabalham na agricultura, pelo que apelamos a participarem no ensino, ainda que continuem a cuidar das famílias e a produzirem", disse Comoana.

Dados do Ministério de Educação indicam que os índices de analfabetismo são altos em mulheres em idade escolar no país. Atualmente, as estatísticas apontam que a taxa de analfabetismo entre as mulheres em Moçambique (52 por cento da população) ronda os 37,5 por cento.

Entretanto, o Governo, através dos serviços de educação, tem vindo a introduzir vários programas de alfabetismo e educação de adultos.

Outra iniciativa em curso é o programa "família sem analfabetismo", que ajuda idosos e outros membros de família impossibilitados de assistirem a aulas em centros, a poderem aprender em suas casas.

Fonte: Página Global

quinta-feira, 1 de março de 2012

GUINÉ EQUATORIAL TEM POVO NA POBREZA E UM DITADOR MILIONÁRIO




Eduardo Febbro - Direto de Paris – Carta Maior

Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é um dirigente chave e um homem excepcional. Com uma fortuna pessoal de 468 milhões de dólares, mais do que a rainha da Inglaterra ou o emir do Kuwait, o presidente da Guiné Equaotiral é o chefe de Estado africano mais rico do continente. Prova de sua opulência, a polícia francesa confiscou há alguns dias uma pitada da fabulosa fortuna de sua família, neste caso de seu filho Teodorín, na luxuosíssima Avenida Foch, de Paris.

Paris - Há homens que merecem seu lugar na história. As democracias ocidentais – e não são as únicas - reconhecem a eles esse direito especial e, por isso, entre petróleo, gás, florestas e exploração de minerais, concederam privilégios e honras exorbitantes a um punhado de ditadores corruptos e homicidas que tem, nos bancos internacionais, mais dinheiro que o orçamento nacional do país que dirigem. O presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, é um deles. Este ditador está há 31 anos no poder e hoje é o presidente da União Africana (UA), o organismo panafricano fundado graças à abnegação de Muammar Khadafi.

Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é um dirigente chave e um homem excepcional. Com uma fortuna pessoal de 468 milhões de dólares, mais do que a rainha da Inglaterra ou o emir do Kuwait, o presidente da Guiné Equaotiral é o chefe de Estado africano mais rico do continente. Prova de sua opulência, a polícia francesa confiscou há alguns dias uma pitada da fabulosa fortuna de sua família, neste caso de seu filho Teodorín : na luxuosíssima Avenida Foch, de Paris, o milionário Teodorín, também ministro de Agricultura e Florestas desta ex-colônia espanhola, tem um prédio de 5 mil metros quadrados, com seis pisos, 101 quartos, uma sala com colunas de coral, uma coleção de 500 pratos, uma mesa de cristal de 200 metros de comprimento, um dormitório de 200 metros quadrados, um salão de beleza, uma discoteca, um cassino ao melhor estilo de Las Vegas e um monte de roupas, joias e vinhos de vários milhões de euros. Este é apenas um segmento da cleptocracia sem freios : os Obiang tem propriedades dos sonhos até no Rio de Janeiro ou Malibú.

No ano passado, respondendo a uma ação apresentada pela ONG Transparência Internacional contra os dirigentes africanos que acumularam fortunas monumentais na França, a Justiça confiscou 11 automóveis de luxo dos Obiang. Entre eles havia um Aston Martin vermleho V8 V600 Le Mans (há apenas 40 exemplares no mundo), um Rolls Royce Phantom conversível, Ferraris, Porsches e um Maserati MC12, do qual só existem 50 no mundo. O ilustre Teodorín ganha oficialmente 3.300 euros mensais. De onde vem o dinheiro com o qual comprou esses automóveis e os demais objetos encontrados em sua residência em Paris.

O filho do ditador cobra gordas comissões das multinacionais madeireiras que operam nas florestas tropicais da Guiné Equatorial. Fontes da Transparência Internacional adiantaram que se trata de uma espécie de « imposto revolucionário » aplicado às multinacionais. O resultado da cobrança desse «imposto » pode ser encontrado na casa parisiense dos Obiang : um relógio Piaget Polo decorado com 498 diamantes (598 mil euros), duas jarras de porcelana (220 mil euros), três jarros do século XVIII com elefantes e rinocerontes (500 mil euros), uma cômoda da época da Realeza (2,8 milhões), um lote de 300 garrafas de vinho Chateu Petrus (2,1 milhões), mais outro lote de Romanée-Conti (250 mil euros).

Uma grande parte da população da Guiné Equatorial vive em situação de extrema pobreza e reprimida, mas as capitais que fazem negócios com o poder e recebem seus fundos não estão preocupadas com isso. Esse país da África Ocidental tem apenas um milhão de habitantes. Hoje é o terceiro produtor subsaariano de petróleo e gás graças à presença dos grupos petroleiros estrangeiros que se instalaram nos anos 90.

Além de estar a fente de seu país e de uma organização de 53 nações como a União Africana, Tedoro Obiang Nguema Mbasogo tem sido um ditador persistente : em suas três décadas de poder perdeu apenas um punhado de votos. Chegou à presidência em 1979 mediante um golpe de Estado e, em 1989, organizou um simulacro de eleições que ganhou com 99,96% dos votos. O grande Teodoro se reelegeu em 1996 com 99%, em 2002 obteve 97% e, em 2009, 95,4%. Foi uma façanha que o fez figurar no terceiro posto da lista dos dez presidentes melhores eleitos do mundo, atrás apenas de Ismail Omar Guelleh, de Djibuti, com 100% dos votos, e do presidente sírio Bachar el-Assad, com 97,6%. O décimo posto era ocupado pelo ex-presidente do Egito, Hosni Mubarak (88,6%).

Os seus vínculos com a máfia e a corrupção são tão notórios que os analistas regionais adotaram uma curiosa denominação : narco-petro-ditador. Teodoro Nguema Mbasogo é um produto da história colonial e da posição que o Ocidente adotou com essas encarnações do mal cujos tronos estão apoiados sobre solos transbordantes de gás e petróleo. Com isso compraram as medalhas e o silêncio ocidental. E não só da Europa ou dos Estados Unidos. O presidente Teodoro Obiang Nguema Mbasogo possui no Rio de Janeiro um apartamento de cerca de 3 mil metros quadrados no bairro de Ipanema pelo qual pagou 34 milhões de euros (cerca de 80 milhões de reais).

Esses dirigentes assistem a cúpulas internacionais, realizam visitas de Estado com toddas as honras, vestem-se com a alta costura de Paris, enquanto suas sociedades sucumbem. São, além disso, muito zelosos a respeito de seu estatuto. Quando o presidente da Guiné Equatorial visitou a Argentina em 2008 para firmar uma série de acordos bilaterais, Cristina Fernández de Kirchner lembrou ao mandatário algumas de suas obrigações básicas. No ato protocolar realizado no salão branco da Casa Rosada, a presidenta argentina disse a Obiang que não podia deixar passar a ocasião para manifestar sua « profunda preocupação com a situação dos direitos humanos denunciadas pelas Nações Unidas em seu país ». O mandatário se enfureceu e quase saiu da sala batendo a porta.

O filho do proto-ditador leva uma existência dourada de playboy : vive entre Estados Unidos, Brasil, Canárias e Paris. Os juízes franceses estão convencidos de que o ministro Teodorín Obiang comprou todas essas riquezas graças a fundos públicos subtraídos ilegalmente. A empresa madeireira guineana Somagui Florestal, que pertence ao ministro, realizou uma série de giros e transações suspeitas no exterior, acabando por dar origem a um processo. Talvez não seja o último. A Transparência Internacional interpôs outras demandas similares por « bens mal adquriridos » contra outros dois chefes de Estado africanos : Omar Bongo, do Gabão, e Denis Sassou-Nguesso, do Congo. Françoise Desset, a juíza encarregada de delitos financeiros, os acusa de « desvio e recepção de fundos públicos », « lavagem de dinheiro », « abuso de bens sociais » e « abuso de confiança ».

Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: Página Global

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Frio intenso castiga população pobre e causa mortes na Europa

Stanislaw, um morador de rua de Varsóvia, na Polônia, improvisa sua moradia nas galerias subterrâneas do sistema de esgoto da cidade para se abrigar do frio. Pelo menos nove pessoas morreram de hipotermia no país na última madrugada, o que eleva a 29 o número de vítimas do frio na Polônia desde a chegada da onda de ar polar, na última sexta-feira   Foto: AFP
Stanislaw, um morador de rua de Varsóvia, na Polônia, improvisa sua moradia nas galerias subterrâneas do sistema de esgoto da cidade para se abrigar do frio. Pelo menos nove pessoas morreram de hipotermia no país na última madrugada, o que eleva a 29 o número de vítimas do frio na Polônia desde a chegada da onda de ar polar, na última sexta-feira 


Homem sem-teto que usa o esgoto como abrigo observa a rua de um bueiro, em Varsóvia  Foto: AFP
Homem sem-teto que usa o esgoto como abrigo observa a rua de um bueiro, em Varsóvia


Anna Svrcinova, uma moradora de rua, passa as noites frias de Praga, na República Checa, em uma fábrica abandonada  Foto: AP
Anna Svrcinova, uma moradora de rua, passa as noites frias de Praga, na República Checa, em uma fábrica abandonada


As mãos de um morador de rua, com feridas agravadas pelo frio intenso em Bucareste, na Romênia  Foto: Reuters
As mãos de um morador de rua, com feridas agravadas pelo frio intenso em Bucareste, na Romênia


Perto do grupo de sem-teto que dorme sob a ponte, gelo cobre lixeiras na capital da República Checa  Foto: Reuters
Perto do grupo de sem-teto que dorme sob a ponte, gelo cobre lixeiras na capital da República Checa


Fontes e fotos: Reuters e AP

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Lábia Universal

Por Rowan Moore Gerety

As autoridades dão um tratamento opaco aos processos criminais contra a Iurd, afirma ativista de direitos humanos. Foto: Rowan Moore Gerety

Poucos lugares do planeta fornecem terra mais fértil para uma mensagem de cura e prosperidade do que Moçambique. Com 90% da população tentando sobreviver com menos de dois dólares por dia, com metade das crianças sofrendo com desnutrição crônica, o país africano tornou-se um poderoso centro de captação de adeptos para a Igreja Universal do Reino de Deus, a Iurd.
Um exemplo do poder que a neopentecostal brasileira adquiriu em Moçambique ocorreu numa manhã de setembro de 2011. A Iurd promoveu o chamado “Dia de Decisões” (ou “Dia D”), um megaculto realizado no Estádio Nacional de Maputo, capital moçambicana. Teve como objetivo promover curas e demonstrações de fé e, claro, atrair novos fiéis. A igreja reuniu 42 mil pessoas no local e ainda viu outras 30 mil se aglomerarem do lado de fora, acompanhando via telão. As pessoas carregavam rosas nas mãos, símbolo do evento. A compor a massa estavam, entre ou-tros desesperados, jovens vítimas de poliomielite com suas bengalas, camponeses idosos descalços e vendedores ambulantes a sonhar com uma recompensa maior.
O megaculto marcou um ano lucrativo para a Iurd em Moçambique. O canal de televisão da igreja, a TV Miramar, ratificou-se como a líder de audiência. O seu apóstolo, Edir Macedo, foi recebido pelo presidente, Armando Guebuza. O chamado “Cenáculo da Fé”, um megatemplo para cultos, foi inaugurado em Maputo. E, por último, a concentração de populares no Dia D, que contou com a presença do primeiro-ministro Aires Ali e da ministra da Justiça, Benvinda Levy, entre outros figurões da política local.
Durante 20 anos de existência em Moçambique, a Iurd cresceu sempre além das expectativas e apesar das vozes contrárias de seus críticos. Nos primeiros anos da expansão, a Iurd enfrentou o então ministro de Cultura e Desporto, Mateus Katupha, que criticou o uso de instalações esportivas para eventos religiosos (enquanto seu atual sucessor presenciou o Dia D in loco). Em meados dos anos 1990, o falecido Carlos Cardoso, estrela do jornalismo moçambicano, publicou uma série de editoriais dizendo que a Iurd constituía uma empresa, ao invés de uma igreja, e como tal, deveria ser sujeita a impostos. -Concorrentes do canal Miramar – a TIM e a STV – têm feito reportagens sobre ex-fiéis da Iurd que entregaram as suas casas à igreja, na esperança de recompensas divinas.
Até hoje, epítetos como “Pastores Ladrões” e a “Igreja de Burla” (fraude), em homenagem à Universal, ecoam nos transportes públicos em Maputo. Descontentes com a igreja de Edir Macedo existem aos borbotões.
Num grupo de coral de outra igreja, a reportagem encontrou três personagens que lamentam ter participado dos quadros da Iurd. Graça entregou um crédito bancário no altar da Iurd para resolver um conflito com seu marido. Selma, que procurou seu filho durante 20 dias na Suazilândia e, aconselhada por um pastor, doou 1,2 mil dólares à igreja antes de tomar conhecimento do seu assassinato. E Felicidade, que interrompeu a construção da sua casa e deixou 25 sacos de cimento no quintal da igreja para se beneficiar de uma bênção anônima.
As três senhoras recordavam as exortações, entrevistas individuais e visitas à casa feitas pelos pastores da Universal, prática posteriormente considerada pelas três como mecanis-mo de manipulação.
Apesar das críticas, a Iurd estabeleceu-se como um ancoradouro na corrente principal da sociedade moçambicana. Nenhuma das queixas-crimes apresentadas contra a Iurd já logrou uma decisão judicial. A TIM e a STV cobram alto pelo enquadramento dos spots da Iurd em suas programações. A imprensa independente, apesar dos comentários ocasionalmente mordazes contra ela, deixa-se subsidiar pela propaganda. Um anúncio recente mostra um grupo de fiéis levantando retratos do presidente Guebuza durante uma “oração pela paz” da Iurd.
Tensões antigas com membros do gover-no foram resolvidas por meio de uma sutil simbiose com a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), o partido no poder. “Certo, há muitos críticos”, assentiu José Guerra, fundador e presidente da Iurd em Moçambique. “Mas a Igreja fica mais cheia todos os dias.”
Para o Dia D, a estratégia de coerção da Universal assumiu o estilo das campanhas eleitorais. Caminhões com alto-falantes percorreram de forma constante os bairros de Maputo durante dois meses, tocando uma quizomba (música típica) sob encomenda.
A base da publicidade era um pôster, onipresente nas paredes e nos esgotos de Maputo, demonstrando o poder cura-tivo da fé: um par de pés coberto de repugnantes lesões (“Antes”) e, do outro lado, outro par, saudável e sem mancha nenhuma (“Depois”). “Meu nome é Armando”, anunciava o cartaz. “Sofri com feridas nos pés durante muito tempo. Mas, no dia em que tomei a decisão de participar de uma concentração de fé, fui curado e hoje estou livre.”
A Iurd foi a primeira igreja evangélica a se implantar em Moçambique, depois da longa e devastadora “Guerra de Desestabilização” (1976-1992).
A memória da antipatia marxista à religião, durante os primeiros anos da independência e do catolicismo paternalista do estado colonial, permitiu que a Iurd encontrasse um povo aberto a uma nova forma de expressão religiosa. Ganhou adeptos com o mesmo discurso existente no Brasil: a flexibilidade das suas orações, a ausência de regras fixas para os fiéis e, acima de tudo, pela grandeza da sua promessa de transformação pessoal.
Para cativar os fiéis, a Universal utiliza-se das mesmas mandingas e talismãs típicos das religiões afro de Moçambique, justamente as que tanto criticam por, na visão da própria Iurd, promoverem “feitiçaria”. A utilização de um óleo abençoado e um tratamento espiritual à base de envelopes com dicas a seguir (e pedidos de donativos) são de praxe. “Eles entendem de feitiçaria e tradição africana muito bem. Dão incensos, pulseiras e todas as coisas que um curandeiro dá”, afirma o Pastor Claudio Mulungo, da concorrente Igreja Maná.
A Igreja Universal, como a própria admite, tem a ousadia de prometer milagres a quem tiver a ousadia de pedi-los com convicção – muitos deles ambíguos e presenciados pela reportagem.
E todos os “milagres” do Dia D tenderam ao “infalível” frente às câmeras do Miramar. Um idoso com dores crônicas nas pernas conseguiu correr e tornou-se, nas palavras do pastor acompanhante, um paraplégico curado. Quando voltou a sentar, o senhor me confiou, em voz baixa, que seus pés recomeçaram a doer. Na lógica da Iurd, não “ser abençoado” ou não se beneficiar de um milagre qualquer significa um sacrifício insincero, uma fé insuficiente por parte do fiel. Os milagres malogrados (como o de um rapaz em cadeira de rodas, acorrentado a um cateter, a quem o testemunho público nem foi proposto, apesar do esforço feito para se levantar) não são divulgados. O mais importante é mostrar o sentimento do possível, de acreditar numa inversão da pers-pectiva calvinista: quem for um crente perfeito terá recompensa sem limite.
Dois dias antes do Dia D, Alice Mabota, presidente da Liga Moçambicana de Direitos Humanos (LDH), folheou o Código Penal, detendo-se no crime de burla – obtenção dos bens de outrem por meios fraudulentos.
A aplicação da lei a donativos religiosos poderia estabelecer um prece-dente polêmico: os partidários da Iurd defendem-se de acusações de burla por invocarem a livre e espontânea vontade dos doadores. Porém, existem casos na Iurd, afirma Mabota, que se aproximam de contratos verbais.
O escritório de serviços paralegais da Liga em Maputo recebe, com regularidade, reclamações de burla contra a Iurd, mas os queixosos sempre desistem antes de levar os seus casos à Procuradoria. Algumas disputas laborais da Iurd (por dispensas ilícitas, dívidas à segurança social, discriminação entre moçambicanos e brasileiros) foram resolvidas por acordos de indenização em favor de ex-funcionários da igreja, que já gastou mais de 100 mil dólares com isso. Várias grandes empresas estrangeiras em Moçambique já foram penalizadas dessa forma. Porém, os poucos processos de crime já iniciados contra a Iurd, segundo Mabota, são reféns de uma instrução opaca por parte da Procuradoria.
“Em um Estado normal, (esses casos) receberiam uma decisão. Mas aqui, não. É por causa do poder de influência da igreja através do medo.” As atividades da igreja de Edir Macedo em Moçambique não parecem ter suscitado o menor interesse das autoridades tributárias. “Aqui, em Moçambique”, disse Felicidade, antiga integrante da Universal, “eles (a Iurd) fazem e desfazem, porque o nosso governo aceita.”
Alice Mabota enumerou vários membros influentes do governo adeptos da igreja de Macedo. “Por que nossos dirigentes a frequentam?”, interrogou-se.
“Para mim, é o governo a cuidar de si mesmo. Quando chega a hora de votar, eles vão mobilizar todo o povo da Igreja Universal para votar neles.”
Ela vê um padrão de exploração no discurso de esperança ilimitada e sacrifício material promovido pela Universal. “O que é que vão decidir no Dia D?”, perguntou-me, dias antes do evento: “Vão decidir ter marido, vão decidir ter emprego, vão decidir serem ricos. Acha que é verdade? Mas como dizer a uma pessoa que não tem instrução para não acreditar nisso se deseja tanto acreditar?”.
No Dia D, após a “hora dos milagres”, a multidão foi instruída para voltar para casa com as suas rosas, que atrairiam todo o ruim, todo o mal no ambiente, para depois as levarem a uma Igreja Universal no domingo seguinte, a fim de serem incineradas. “As coisas mudam pouco a pouco”, concluiu Amélia, uma fiel que esperava para partir na boleia de um caminhão.
“Não vale a pena mudar de igreja só por não ver um milagre todos os dias. O Dia me mostrou que Deus existe”, insistiu. Mas eu liguei dias depois para Amélia e, até hoje, sua rosa ficou em casa.

Fonte: Carta Capital

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