HISTÓRICO DO JULGAMENTO
O então ministro Moreira Alves foi o relator do polêmico caso |
O julgamento do pedido de Habeas Corpus (HC 82424) de Sigfried
Ellwanger, iniciado em dezembro de 2002, levou nove meses para
ser concluído. O pedido, no entanto, foi negado em junho daquele ano, quando a
maioria dos ministros entendeu que a prática de racismo abrange a
discriminação contra os judeus.
Após o voto do ministro Moreira Alves, em 12 de dezembro de 2002, um
pedido de vista do ministro Maurício Corrêa suspendeu o julgamento por
divergir do relator. Moreira Alves defendeu a tese de que os judeus não
podem ser considerados como “raça” e Maurício Corrêa questionou “a
interpretação semântica”.
Em abril de 2003, o recurso voltou ao Plenário. Maurício Corrêa
disse que a genética baniu o conceito tradicional de raça e que a
divisão dos seres humanos em raças decorre de um processo
político-social, originado da intolerância dos homens. Foi a vez do
ministro Gilmar Mendes pedir vista. Na mesma sessão, no entanto, o
ministro Celso de Mello preferiu antecipar seu voto, no mesmo sentido
das razões defendidas pelo ministro Maurício Corrêa.
Em junho, o Habeas Corpus voltou a julgamento com o Plenário
completo, já com a presença dos novos ministros da corte, à época os recém-empossados Carlos Ayres Britto,
Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Dos três, o ministro Joaquim Barbosa foi
o único a não votar por ter assumido a vaga do relator do pedido, o
ministro Moreira Alves.
Na sessão de 26 de junho de 2003, após o voto do ministro Antônio
Peluso houve o pedido de vista do ministro Carlos Ayres Britto. Nesta
mesma sessão, votaram os ministros Gilmar Mendes, Carlos Velloso, Nelson
Jobim, e Ellen Gracie. A votação já havia atingido a maioria com o
indeferimento do pedido, por 7 votos a 1. O ministro Marco Aurélio, no
entanto, pediu vista do recurso.
O Habeas Corpus finalmente voltou ao Plenário em setembro daquele ano, com os
votos dos ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence. Após a concessão
do recurso pelo ministro Marco Aurélio, os ministros Celso de Mello,
Carlos Velloso, Gilmar Mendes, Nelson Jobim e Cezar Peluso reiteraram
seus votos. O ministro Sepúlveda Pertence encerrou o julgamento.
HISTÓRICO DO CASO
Siegfried Ellwanger, escritor e editor de livros Rio Grende do Sul, antigo sócio
diretor da Revisão Editora Ltda., foi condenado pelo Tribunal de Justiça
daquele estado por ter editado e vendido livros com ideias
preconceituosas e discriminatórias contra os judeus.
A Carta Constitucional de 1988 define a prática de racismo como crime inafiançável e imprescritível, segundo o que dispõe o artigo 5º, XLII.
Ellwanger impetrou habeas corpus no STJ a fim de que fosse
retirada sua condenação de racismo e que ele pudesse requerer a extinção
da pena. À luz do artigo 20 da Lei nº 7.716/1989 e pelo disposto no
artigo 5º, XLII, da Constituição Federal, o STJ condenou o impetrante de
acordo com a pena prevista no artigo 20 da Lei nº 7.716/1989, com nova
redação da Lei 8.081, entendendo que o preconceito e a discriminação
contra judeus é racismo.
Inconformado, o condenado impetrou Habeas Corpus (HC 82424) junto ao Supremo Tribunal Federal e seu julgamento, iniciado em dezembro de 2002 e finalizado no ano seguinte, tornou-se um dos mais importantes da jurisprudência recente de nossa Corte Constitucional.
VEJA ABAIXO COMO VOTARAM OS MINISTROS:
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Voto do Ministro Moreira Alves - O
ministro Moreira Alves entendeu que “os judeus não podem ser
considerados uma raça”, por isso, não se poderia qualificar o crime por
discriminação, pelo qual foi condenado Siegfried Ellwanger, como delito
de racismo. O relator concedia o Habeas Corpus, declarando extinta a
punibilidade do acusado, pois já teria ocorrido a prescrição do crime.
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Voto do Ministro Maurício Corrêa - Corrêa
divergiu do relator, ao negar o Habeas Corpus sob o argumento de que a
genética baniu de vez o conceito tradicional de raça e que a divisão dos
seres humanos em raças decorre de um processo político-social originado
da intolerância dos homens. Para Maurício Corrêa, a Constituição coíbe
atos desse tipo, “mesmo porque as teorias anti-semitas propagadas nos
livros editados pelo acusado disseminam idéias que, se executadas,
constituirão risco para a pacífica convivência dos judeus no país”.
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Voto do Ministro Celso de Mello - O
ministro acompanhou a dissidência, afirmando que “só existe uma raça: a
espécie humana”. E frisou: “Aquele que ofende a dignidade de qualquer
ser humano, especialmente quando movido por razões de cunho racista,
ofende a dignidade de todos e de cada um”. Achou correta a condenação de
Ellwanger, negando-lhe o Habeas Corpus.
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Voto do Ministro Gilmar Mendes - Gilmar
Mendes também negou a ordem de Habeas Corpus, por entender que “o
racismo configura conceito histórico e cultural assente em referências
supostamente raciais, aqui incluído o anti-semitismo”. Para Mendes, “não
se pode atribuir primazia à liberdade de expressão, no contexto de uma
sociedade pluralista, em face de valores outros como os da igualdade e
da dignidade humana”. Por isso o texto constitucional erigiu o racismo
como crime inafiançável e imprescritível.
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Voto do Ministro Carlos Velloso - Carlos
Velloso também indeferiu o Habeas Corpus, por acreditar que o
anti-semitismo é uma forma de racismo. Segundo o ministro, nos livros
publicados por Ellwanger, os judeus são percebidos como raça, porque há
pontos em que se fala em “inclinação racial e parasitária dos judeus”, o
que configuraria uma conduta racista, vedada pela Constituição Federal.
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Voto do Ministro Nelson Jobim - O
ministro Nelson Jobim julgou que Ellwanger não editou os livros por
motivos históricos, mas como instrumentos para produzir o
anti-semitismo. Para ele, esse é um “caso típico” de fomentação do
racismo, por isso acompanhou a ala dissidente, negando o Habeas Corpus.
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Voto do Ministra Ellen Gracie - Em
seu voto, a ministra Ellen Gracie trouxe a definição de raça presente
na Enciclopédia Judaica, na qual “a concepção de que a humanidade está
dividida em raças diferentes encontra-se de maneira vaga e imprecisa na
Bíblia, onde, no entanto, como já acentuavam os rabinos, a unidade
essencial de todas as raças é sugerida na narrativa da criação e da
origem comum de todos os homens”. Nessa linha, negou a ordem.
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Voto do Ministro Cezar Peluso - Peluso
seguiu a maioria e votou pela denegação do Habeas Corpus. “A
discriminação é uma perversão moral, que põe em risco os fundamentos de
uma sociedade livre”, disse.
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Voto do Ministro Carlos Ayres Britto - Carlos
Ayres Britto concedia o Habeas Corpus de ofício – por iniciativa do
próprio Supremo – pois entendeu não haver justa causa para instauração
de ação penal contra Ellwanger. Em seu voto, Britto absolvia, então, o
réu, por atipicidade do crime, porque a lei que tipificou o crime de
racismo por meio de comunicação foi promulgada depois de Ellwanger ter
cometido o delito.
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Voto do Ministro Marco Aurélio - O ministro Marco Aurélio também concedia o Habeas Corpus, defendendo a tese da liberdade de expressão. “A
questão de fundo neste Habeas Corpus diz respeito à possibilidade de
publicação de livro cujo conteúdo revele idéias preconceituosas e
anti-semitas. Em outras palavras, a pergunta a ser feita é a seguinte: o
paciente, por meio do livro, instigou ou incitou a prática do racismo?
Existem dados concretos que demonstrem, com segurança, esse alcance? A
resposta, para mim, é desenganadamente negativa”. Em sua opinião,
somente estaria configurado o crime de racismo se Ellwanger, em vez de
publicar um livro “no qual expõe suas idéias acerca da relação entre os
judeus e os alemães na Segunda Guerra Mundial, como na espécie,
distribuísse panfletos nas ruas de Porto Alegre com dizeres do tipo
‘morte aos judeus’, ‘vamos expulsar estes judeus do País’, ‘peguem as
armas e vamos exterminá-los’. Mas nada disso aconteceu no caso em
julgamento”. Segundo Marco Aurélio, Ellwanger restringiu-se a escrever e
a difundir a versão da história vista com os próprios olhos.
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Voto do Ministro Sepúlveda Pertence - Sepúlveda Pertence optou por negar o Habeas Corpus ao editor gaúcho. Para o ministro, “a discussão
me convenceu de que o livro pode ser instrumento da prática de racismo.
Eu não posso entender isso como tentativa subjetivamente séria de
revisão histórica de coisa nenhuma”, votou.
* Jurisprudência Traduzida:
Fontes: Site do STF e site Viajus (com adaptações e atualizações pelo autor do Blog). |
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