domingo, 4 de setembro de 2011

O ATIVISMO JUDICIAL POSSUI LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL?




A judicialização da política é um fenômeno observado em diversas sociedades contemporâneas e apresenta, segundo CASTRO (2011), dois componentes característicos: 

(1) um novo "ativismo judicial", isto é, uma nova disposição de tribunais judiciais no sentido de expandir o escopo das questões sobre as quais eles devem formar juízos jurisprudenciais (muitas dessas questões até recentemente ficavam reservadas ao tratamento dado pelo Legislativo ou pelo Executivo); e (2) o interesse de políticos e autoridades administrativas em adotar procedimentos (a) semelhantes aos de um processo judicial (chamados de ‘procedimentos quase-judiciais’) e (b) parâmetros jurisprudenciais em suas deliberações (muitas vezes, o judiciário é politicamente provocado a fornecer esses parâmetros).

Esse novo judiciário exige do aplicador do direito que saia da condição inercial (não no sentido atribuído doutrinariamente ao princípio da inércia do judiciário, mas de passividade) e assuma postura proativa, alinhada com os ditames e valores da pós-modernidade, em todo seu dinamismo. Cobra-lhe a superação do positivismo privatista e do formalismo burocrático para dar lugar ao exercício da cidadania pelos atores sociais, que demandam junto ao judiciário a realização de ações, intervenções e políticas não prestadas ou prestadas insatisfatoriamente pelo Executivo e pelo Legislativo.

 No entendimento de LAGO (2010), analisando a assunção do ativismo judicial pelos órgãos superiores do poder judiciário em suas decisões:

 Em nada fere a (...) tese de tripartição de poderes o reconhecimento de poder ao Supremo Tribunal Federal para dar concretude à Constituição. Tanto é assim para quem defende ser o Supremo Tribunal Federal, enquanto no exercício de jurisdição constitucional, um órgão acima da tripartição de poderes, como um Tribunal Constitucional, como para quem o reconhece apenas como órgão máximo do Poder Judiciário.

Nesse sentido, não vislumbro no texto constitucional (nem explícita, nem implicitamente, muito menos em seu aspecto principiológico) qualquer elemento que aponte para a vedação da postura ativa do julgador (ativismo judicial), subtraindo assim a validade e a legitimidade de tal conduta.

No Brasil, o Supremo Tribunal Federal, guardião da Carta Magna, é quem tem assumido mais visivelmente, na figura de alguns dos seus ministros (dentre eles citamos Gilmar Mendes e Celso de Mello) e em acórdãos do pleno – no enfrentamento de questões complexas onde se discutem, dentre outras coisas, omissões de políticas públicas por parte do Executivo ou a ausência de normatização pelo Legislativo – o protagonismo e a independência necessárias à resolução de disputas e demandas que por vezes envolvem problemas da seara política.

Isto posto, nada vejo de estranho em assim julgar o judiciário. A Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXV, dispõe de forma bastante clara que: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Logo, se questões como as acima citadas ocorrem de ser levadas a apreciação do Supremo, não há como furtar-se um ministro que o compõe, nem há como eximir-se aquele órgão de enfrentá-la e sobre ela decidir, desde que fundamentadamente.

Tal ativismo, contudo, a despeito de se querer afirmar que se trata na verdade de mera intromissão na esfera de competência (ou de atribuições) de outros poderes, não surge por acaso, pois toma por base a constitucionalização de direitos, numa visão garantidora da efetividade dos direitos fundamentais, articulada também com o respaldo dos mecanismos de freios e contrapesos. Fato que nos remete então à resposta da segunda questão acima formulada, qual seja, a de que não se pode falar aqui em ofensa à separação de poderes (ou funções) do Estado.

No ponto, entendo não haver ofensa ao princípio da separação tripartite de poderes do Estado pelo fato de que a simples existência de três poderes – independentes e harmônicos entre si, como quer o caput do artigo 2º da Constituição Federal – não significa dizer que os mesmos sejam estanques, desvinculados, isolados, insulados. Nada disso! O que se estabeleceu teoricamente, com o passar do tempo, a partir de uma leitura aprofundada e mais coerente com o pensamento do filósofo Montesquieu – bem como para com os princípios e ideias que regem o atual momento histórico – foi que os poderes (ou funções) do Estado se interrelacionam, se intersectam.

Em várias situações o que vemos é a existência de um diálogo, um verdadeiro intercâmbio entre os mesmos, sem que com isso se veja abalada a aludida prescrição constitucional. Apenas para exemplificar, cito a recente escolha do novo membro do STF. O festejado Ministro Luiz Fux, segundo os ditames da própria Constituição Federal, foi: 1º) indicado pela chefe do Poder Executivo da União; 2º) sabatinado pela CCJ do Senado Federal e posteriormente aprovado pela maioria absoluta dos membros daquela Casa e 3º) teve publicada sua nomeação pela Presidente da República no Diário Oficial da União.

Como se vê, no processo de escolha de um membro do Poder Judiciário houve a participação decisiva e direta de membros dos dois outros poderes da República, dando-lhe a legitimidade necessária para o exercício de tão relevante cargo.

Portanto, desde que mantidas a harmonia e a independência entre os poderes, não há que se falar em intromissão, ingerência ou qualquer ofensa a princípio dessa magnitude.

REFERÊNCIAS
CASTRO, Marcos Faro de. O Supremo Tribunal Federal e a judicialização da política. Disponível em: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_34/rbcs34_09.htm. Acesso em: 02.02.2011

LAGO, Rodrigo. A hermenêutica constitucional como instrumento de acesso à justiça. Disponível em: http://www.osconstitucionalistas.com.br/a-hermeneutica-constitucional-como-instrumento-de-acesso-a-justica. Acesso em 30.06.2010 

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