Reprodução: Marcos Brindicci/Reuters
O Senado do Paraguai aprovou nesta sexta-feira o impeachment do
presidente Fernando Lugo, por 39 votos favoráveis, contra 4 (e duas
abstenções). Considerado culpado por deputados e senadores, o chefe de
estado foi automaticamente afastado do cargo - ele é o primeiro
presidente a ser destituído na história do país. Quem assume em seu
lugar é o vice-presidente, Federico Franco, que deve permanecer no posto
até a realização de eleições gerais previstas para abril de 2013.
Franco foi convocado de imediato para prestar juramento diante do
Congresso Nacional como novo presidente do Paraguai. Líder do Partido
Liberal, ele é membro da Aliança Patriótica para a Mudança (APC),
coalizão que venceu as eleições presidenciais de 2008.
Cinco acusações contra Lugo
A comissão de acusação apresentou documento com cinco argumentos contra o presidente:
1. Massacre de Curuguaty
2. Protesto de grupos socialistas na sede das Forças Armadas, com a aprovação de Lugo - considerado um desrespeito à ordem nacional
3. Assinatura arbitrária de um controverso protocolo, o que foi visto pelos opositores como um atentado à soberania da República
4. Incapacidade do presidente em conter a insegurança que assola o país
5. Instabilidade causada no campo, especialmente em Ñacunday, devido às invasões de terras - que teriam sido facilitadas por Lugo
2. Protesto de grupos socialistas na sede das Forças Armadas, com a aprovação de Lugo - considerado um desrespeito à ordem nacional
3. Assinatura arbitrária de um controverso protocolo, o que foi visto pelos opositores como um atentado à soberania da República
4. Incapacidade do presidente em conter a insegurança que assola o país
5. Instabilidade causada no campo, especialmente em Ñacunday, devido às invasões de terras - que teriam sido facilitadas por Lugo
Em seu discurso oficial após a decisão, Fernando Lugo acusou o
Legislativo de "ferir profundamente" a democracia, que, segundo ele, foi
"traída covarde e traiçoeiramente" pelo Senado. O ex-presidente afirmou
ainda que a Casa transgrediu todos os direitos de defesa e reiterou que
sempre atuou de acordo com a lei. "Hoje, não é Fernando Lugo que recebe
um golpe, é a história paraguaia e sua democracia", declarou, afirmando
também estar disposto a responder por suas ações como ex-mandatário.
Aprovado a toque de caixa, o processo de impeachment de Lugo durou pouco mais de 24 horas: da manhã de quinta-feira, quando a Câmara aprovou o pedido de julgamento político
por 76 votos contra 1 (da deputada do partido de esquerda Frente
Guazú), até o fim da tarde desta sexta, quando o Senado - a quem cabia a
decisão final - decidiu cassar o chefe de estado. Lugo é acusado de
"mau desempenho de suas funções" de presidente, após a morte de 17
pessoas, entre policiais e camponeses, em confronto armado durante uma
reintegração de posses há uma semana.
Defesa e acusação - O presidente se ausentou durante
todo o processo e enviou seus representantes, que argumentaram que as
acusações contra o presidente careciam de provas concretas e criticaram a
"subjetividade" dos congressistas. Enquanto a sessão ocorria no Senado,
Lugo participou de uma reunião ministerial com representantes de
Brasil, Argentina, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Uruguai e
Venezuela, além do secretário-geral da Unasul, Alí Rodríguez Araque, no
Palácio Presidência.
O argumento da acusação foi o de que Lugo, além de mau desempenho como
presidente, tem vínculos com grupos guerrilheiros e está estimulando um
conflito social no país (leia mais no quadro ao lado). Os senadores deram menos de 24 horas para Lugo preparar sua defesa,
e o presidente teve duas horas desta sexta para apresentar seus
argumentos diante do plenário, marcadamente oposicionista. A rapidez com
que o caso foi analisado levantou uma série de discussões, e o próprio governo brasileiro chegou a considerar um "golpe de estado", o que motivou uma mobilização da União de Nações Sul-Americanas (Unasul).
Federico Franco (à esq.), ao lado de Lugo
Dentro da lei - Por mais que impressione a rapidez com
que todo o processo foi julgado, os parlamentares tiveram o cuidado de
trabalhar dentro da lei. O "impeachment relâmpago" é legal, afirma o
especialista em política latino-americana e professor de Relações
Internacionais da ESPM, Mario Gaspar Sacchi. O artigo 225 da
Constituição nacional determina que um chefe de estado pode sofrer um
processo de impeachment em caso de "mau desempenho de suas funções,
delitos cometidos no exercício de seus cargos e crimes comuns".
Sacchi explica que cabe à Câmara de Deputados averiguar se há condições
formais para a abertura do processo, que então deve ser julgado pelo
Senado, que se converte em uma espécie de tribunal. "É um processo
rudimentar, da época colonial, e você precisa lembrar que o Paraguai é
um país que viveu uma série de ditaduras, então é muito fácil tirar
alguém do poder", diz o especialista. Sacchi ressalva que o tempo exíguo
dado a Lugo para arquitetar sua defesa lança uma sombra sobre o
processo. "Não é o que seria esperado em uma democracia."
Biografia - Fernando Lugo é um ex-bispo da religião
católica, eleito há quatro anos no Paraguai com promessas de defender as
necessidades dos pobres. A reforma agrária era uma das prioridades de
seu governo, mas o chefe de estado teve dificuldades para aproximar
posições entre as organizações camponesas e os proprietários, na medida
em que buscava colocar ordem no organismo encarregado pela distribuição
de terras. No início deste ano, o presidente veio ao Brasil para tratar
um linfoma, no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Internado para a
realização de exames de controle, seguiu o tratamento de um câncer
detectado em agosto de 2010.
Fonte: veja.abril.com.br