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IX GIUGNO MDCCCLXXXIX
A BRUNO
IL SECOLO DA LUI DIVINATO
DOVE IL ROGO ARSE
(Dizeres da placa em homenagem a Giordano Bruno, Campo dei Fiori, Roma)
"What's is a name? That which we call a rose by any other name would smell as sweet."
(William Shakespeare)
Nunca foi fácil prever o futuro; pelo menos para quem não tem premonições - ou nelas não acredita -, muito menos manipula os dados por interesses econômicos ou pessoais. Agora, porém, em tempos sombrios de perene crise, a complexidade não permite senão um arremedo de mirada para o futuro. Como diziam as avós: "o futuro a Deus pertence!" Nada impede, porém, fazer-se algumas observações daquilo que se apresenta como indícios.
O problema do mundo segue sendo o de sempre: a questão da verdade! E gente segue morrendo por ele, em que pese os avanços do conhecimento. Afinal, séculos e séculos de conquistas não foram suficientes para fazer ver aos povos que o desejo é fruto do limite, dado que se deseja o que se não tem. E que é ele que move o mundo iluminando com a razão as trevas da ignorância.
Não é tão simples, porém, o fiat lux. Afinal, a escuridão não é resultado tão só de um não sabere sim também de um outro saber. Portanto, não se trata de uma simples batalha, como se fora uma catequização; e sim uma perene superação de um saber equivocado, mas resistente; e nele o bastião mais difícil de se lidar: o do lugar da verdade.
Giordano Bruno não foi o único mártir de uma tal cruzada contra a ignorância; mas talvez tenha sido o mais significativo. Queimado vivo (pela ignorância ou pelo resultado dela feito interesse e poder?) no Campo dei Fiori, em Roma ("dove il rogo arse"), sobrevive em bronze,mortinho da silva. Melhor ele, impoluto na sua túnica longa, com o pé para frente como que esmagando a todos e sua ignorância, ou Galileu, vivinho da silva, após abjurar? Veritas est...?
Um pouco da História da Filosofia não faz mal a ninguém e, portanto, não se é permitido ignorar o busílis da questão, aparentemente tão simples: o sol gira em torno da terra ou a terra gira em torno do sol? Pois até Copérnico (e não se esquecer de computar os gregos; e alemães também para alguns menos avisados de hoje em dia!), como se sabe, era o sol que girava em torno da terra, ou melhor, até muito depois (Giordano Bruno que o diga!) para, de repente, sobre a escuridão se fazer luz e ninguém mais duvidar que a verdade é justamente o contrário. E Bruno lá, mortinho da silva, por não ter abjurado aquilo que a mais inofensiva criança sustenta hoje sem qualquer dúvida.
Eis que se coloca, portanto, a questão do rompimento.
Foi-se a um ponto, hoje, no qual a linguagem deixou de ser intermediária para ser protagonista e, assim, constitutiva. E não tanto por ter sido em vão o esforço de se dar conta dos objetos mas porque a Verdade que se pretendia (ou se pensava ser possível) nunca apareceu. Ou melhor, ela sempre veioincompleta, em parte (ou partes) e, portanto, como se fosse uma meia-verdade. Mas esta (umameia-verdade) pode ser considerada a Verdade?
Aqui, a questão não é tão difícil: a verdade é a verdade; e a meia-verdade é a meia-verdade. Logo, não se trata de saber se um relógio é um relógio (está-se de acordo sobre tal objeto, ou pelo menos se pensa assim), mas de ser impossível saber todas as respostas sobre ele. E isto porque serão sempre meias-respostas; como se fossem meios-relógios; ou apenas partes-de-um-relógio. Emeios-relógios não são os relógios. Em suma, não se demorou muito para perceber que se não tem linguagem para dar conta dos objetos; e que eles só podem ser na medida em que se constituem linguisticamente; e ainda que possam conservar algumas de suas características como, por exemplo, lembrou Shakespeare na frase supracitada (e que pode confundir): mesmo que você dê à rosa outro nome ela continuará com seu perfume (tudo isso imaginando ser ela mesma e não uma sua representação).
Vive-se, então, neste ambiente de parcialidade e, portanto, a felicidade só se pode conquistaraprendendo-se a gozar, embora, não tudo. Afinal, é necessário ter amanhã para se fazer o que se não fez hoje, diriam os otimistas; e assim com o futuro. Veja-se.
Os próximos tempos (seria em 200 anos?) reserva a todos a transferência da matéria. Como no velho seriado "A Feiticeira", pode ser que em um simples "mexer" com a ponta do nariz alguém "desapareça" de onde estiver e "apareça" em outro lugar. Nesse tempo, nada - ou quase nada - do Direito atual faria sentido, começando por intimidade, privacidade, propriedade, criminalidade eassim por diante. Mas se poderia pensar em perder o sentido a própria vida; e a partir dela tudo o mais, a começar pela linguagem. Afinal - e apesar dos habermasianos e outros -, fala-se porque se vive e não se vive porque se fala (e aqui pouco se tem para duvidar de Dussel). Ser e tempoterão (ou teriam) outra dimensão, quem sabe aquela na qual tudo estará dado, ou seja, ter-se-á um puro controle, com pleno domínio.
Difícil, não obstante, é a relação do futuro com as "coisas" imateriais, a começar pelo inconsciente. Membro da estrutura psíquica, dele sabe-se pouco. Tem-se a crença, porém, de ser constituído como linguagem (Lacan) e, assim, interferindo no discurso, ajuda a projetar espaços de escuridão naquilo que se toma como verdadeiro.
Nesse campo muito se tem para evoluir porque ai se concentra boa parte do sofrimento humano; mas a evolução esbarra nos homens e seus melindres, tudo fruto da sua mais visíveldiferença. É falso que cobra não come cobra! Por isso, vai-se dois passos adiante e, não raro, voltam-se três. Por trás, as verdades de cada um; sempre elas!
Nesse campo, também, a genética pode representar o avanço (ou a solução?), mas nada se fez de consistente até o momento. O homem segue sendo uma máquina que dribla a ciência a cada momento inexplicável. Logo, tem-se muito para andar.
Um balanço não é simples, como se vê. Em boa escala segue-se com o axioma das avós e, portanto, que "o futuro a Deus pertence!" O homem, porém - e com ele o Direito - seguirá na batalha pelo conhecimento, das coisas e de si mesmo, sempre no seu tempo. O que se pode esperar (e agir para tanto porque não basta tão só observar e eventualmente se revoltar; v., p. ex., Stéphane Hessel) é que tudo seja dentro de um espaço que já se sabe há muito: o da dignidade humana!
Aqui, não é o futuro que atropela a todos; são todos que atropelam o futuro. Giordano Bruno nunca mais!
Fonte: Jornal Carta Forense
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