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domingo, 20 de outubro de 2024

Prefácio de “Ornitorrinco”, de Theotonio Fonseca de Sousa

 

             Rogério Rocha [escritor e filósofo]

É com grande satisfação que apresento este prefácio sobre o livro “Ornitorrinco”, assinado pelo talentoso autor Theotonio Fonseca de Sousa. Como um estudioso da literatura, sinto-me no dever de destacar logo de saída: trata-se de obra singular e multidimensional.

Após uma breve leitura, percebe-se, sem muito esforço, que “Ornitorrinco” desafia qualquer categorização simplista. Sobretudo porque Theotonio Fonseca estrutura sua poesia através de uma escrita que se emaranha entre o barroco/neorrococó e o contemporâneo, o clássico e o moderno.

Fico com a impressão de que ele intenciona reorganizar o universo pela via particular da linguagem. Ou como diz em “Pacto fáustico”: “anseio pela silhueta do campo unificado[...]que traduza a plenitude da mente de Deus”.

Seus versos de muitas faces estão carregados de imagens impressionistas – para não dizer impressionantes – que oscilam entre o passado e o presente. Com eles o autor produz uma densa nuvem de sentidos na miscigenação de referências não só a outros poetas, mas às mitologias greco-romana, judaico-cristã, africana e dos nossos povos originários.

Essa fusão de influências termina por criar uma linguagem rica em simbolismos e texturas. Mediante utilização de temas e abordagens pouco comuns, Fonseca tinge de novas cores antigos e conhecidos pilares estéticos da poesia ocidental.

Antes de dar continuidade ao prefácio, necessito, entretanto, voltar ao título do novo livro. Afinal, é importante esclarecer o que seja um ornitorrinco.

O ornitorrinco é um mamífero encontrado na Austrália e Tasmânia. Da família da não menos esquisita equidna, esse animal interessante, conhecido por sua aparência estranha, nos remete às aberrações encontradas na natureza.

É um mamífero semiaquático que combina características de diferentes animais. Tem o bico de um pato, o corpo de uma lontra e a cauda semelhante à de um castor. Esse animal peculiar é um dos seres mais incomuns do mundo.

Nesse ponto, título e produção do livro convergem para sinalizar ao público a origem pouco convencional do estilo do autor, cuja poesia busca respaldo em imagens que justificariam denominá-la de uma poética ornitorrinca. Poética capaz de provocar alguns abalos theotônicos, diria o saudoso Carvalho Júnior.

O poeta não teme explorar os recantos mais profundos da simbólica universal. Ao conduzir-nos por um labirinto de expressões, ideias-força e terminologias pouco ortodoxas, encontramos ecos do esoterismo, ocultismo, magia e misticismo entrelaçados com passagens bíblicas e fragmentos do ideário do folclore brasileiro.

As religiões de matriz africana e a filosofia também deixam suas marcas, encontrando espaço nos poemas aqui apresentados. Convivem, assim, numa equação imprevisível, mas com efeitos bastante proveitosos.

A poética de Theotonio resulta em uma nova cosmogonia. Seus versos orbitam corpos celestes por vezes não identificados. Eles criam um catálogo de movimentos curiosos e desafiadores em um universo próprio. Características distintivas também presentes em seus livros anteriores.

Cada poema se configura, portanto, como uma constelação singular, e "Ornitorrinco" representa a galáxia que os acolhe. 

 



 
Este livro propõe ao leitor um desafio instigante: a exploração dessas dimensões e a descoberta dos enigmas embutidos na coreografia das palavras, conduzidas com maestria e conhecimento.

“Ornitorrinco” é, deste modo, a coroação da caminhada poética de Theotonio Fonseca. Com este livro, o poeta de Itapecuru-Mirim dá por concluída a sua missão dentro do gênero ao qual se dedicou apaixonadamente.

Demonstrando coerência com seus princípios, finaliza sua jornada com uma obra digna de representar a melhor síntese do que escreveu até hoje. Essa obra intrigante nos envolve com sua beleza, guiando-nos pelos mistérios de um universo peculiar ainda por ser explorado.

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