Ninguém pode ler tudo.” A primeira frase do Manifesto da Altmetria, publicado em 2010, foi inspirada em uma pesquisa divulgada na Universidade de Ottawa, no Canadá, que estimou a produção científica desenvolvida em todo o mundo. De acordo com o estudo, mais de 50 milhões de artigos foram publicados entre 1665, quando surgiu a primeira revista especializada, na França, e 2009, ano de publicação do trabalho. A pesquisa também afirma que mais de 2,5 milhões de trabalhos científicos são publicados a cada ano em revistas especializadas, quase tudo disponível online. Definitivamente, ninguém pode ler tudo.
Organizado por pesquisadores de diferentes instituições norte-americanas, o Manifesto de 2010 apresenta a altmetria (em inglês, altmetrics), que propõe avaliar a repercussão de pesquisas científicas com base nas interações nas redes sociais. Afinal, se a dinâmica de compartilhamento do conhecimento mudou, por que a principal forma de avaliar a repercussão de uma pesquisa continuaria restrita às citações recebidas em outros artigos?
CURTA E COMPARTILHE
“Enquanto as citações levam cerca de dois anos para aparecer, os dados de altmetria proporcionam um retorno imediato do impacto da pesquisa em fontes não tradicionais, como redes sociais e jornais”, afirma o biólogo britânico Mark Hahnel, fundador e CEO do Figshare, um repositório aberto de artigos científicos.
A plataforma desenvolvida por Hahnel exibe informações como o número de downloads e visualizações, além do selo com a avaliação de altmetria desenvolvida pela Altmetric, empresa inglesa que atribui uma pontuação diferente para cada tipo de interação ocorrida com o artigo online. O cálculo dessa pontuação é desenvolvido por um algoritmo, que calcula a relevância de cada ação: uma notícia citando o artigo em um jornal de grande alcance vale mais do que o compartilhamento em uma rede social para poucas pessoas, por exemplo.
Andréa Gonçalves do Nascimento, bibliotecária que pesquisou a altmetria para seu mestrado na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, destaca que as métricas alternativas colaboram para despertar o diálogo entre o cientista e o público leigo. “O cientista acompanhará a repercussão e entrará em contato com as pessoas que se interessaram pelo estudo”, diz, ressaltando que os métodos formais de divulgação não permitem essa interação entre os cientistas e seus leitores.
#PESQUISATOP
Além de estimular a interação entre os pesquisadores e o público, métodos alternativos de divulgação permitem que mais pessoas tenham acesso a pesquisas de ponta, já que, atualmente, a maior parte dos periódicos científicos não são gratuitos. A utilização de novas métricas para calcular o impacto das pesquisas também beneficia países em desenvolvimento, como Brasil e Índia, uma vez que as revistas consideradas mais relevantes reservam a maior parte de suas páginas para publicar pesquisas produzidas em países ricos.
“Mas esses dados adicionais devem beneficiar de verdade os cientistas e suas instituições, trazendo informações novas e relevantes e não somente dizendo a mesma coisa que as métricas tradicionais já dizem”, afirma William Gunn, diretor de comunicação acadêmica da Elsevier, maior editora científica do mundo.
Rita de Cássia Barradas Barata, diretora de avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), ressalta que as métricas alternativas são particularmente úteis para saber o impacto de pesquisas que não têm aplicação tão rápida nem geram patentes. “Quanto da pesquisa que é financiada por recursos públicos é de fato relevante para solucionar problemas da sociedade? A altmetria pode ajudar a tornar isso mais claro”, afirma. Mas a diretora da Capes, uma das mais importantes instituições de financiamento de pesquisa do país, alerta para a necessidade de as métricas contarem com critérios rigorosos. “É mais fácil divulgar em redes sociais, mas é difícil saber se esses números são espontâneos ou manipulados.”
Abel Packer, diretor da biblioteca digital brasileira SciELO, considera que a altmetria não substituirá o método tradicional das citações, mas complementará o trabalho de divulgação. “Existe uma correlação entre ser popular nas redes sociais e receber mais citações no futuro.”
Para que os órgãos de incentivo à pesquisa considerem a altmetria um método seguro para identificar trabalhos relevantes, a comunidade científica precisará trocar curtidas, compartilhamentos e comentários com textões. De acordo com Packer, a partir de 2018 será obrigatória a participação em redes sociais das mais de 400 revistas científicas que fazem parte do acervo da SciELO. “A comunicação está na essência da pesquisa científica. O trabalho que não surge para ser comunicado não tem sentido.”
Os números não mentem
A empresa inglesa Altmetric desenvolveu um algoritmo que calcula a relevância dos artigos científicos citados nas redes sociais e nos jornais
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17 milhões é o número de menções nas redes sociais recebidas pelos 2,7 milhões de artigos científicos rastreados pela Altmetric
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Fonte: Revista Galileu versão Online
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