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domingo, 29 de dezembro de 2024

Tradução Poética: diálogo com Auster e Borges

 

A tradução de poesia é uma arte complexa que exige não apenas um domínio técnico do idioma, mas também sensibilidade para recriar o ritmo, a musicalidade e as imagens do poema original. 

No mais recente exercício de tradução, eu e o poeta Arthur Prazeres mergulhamos nas profundezas das produções de dois gigantes da literatura mundial: Paul Auster e Jorge Luis Borges.

Nosso trabalho com Paul Auster focou em três diferentes versões de seus versos, explorando as nuances que cada escolha tradutória traz à sua poética. Já com Borges, analisamos e recriamos duas versões de seu poema "Inscripción sepulcral". 

Os textos aqui traduzidos, é bom ressaltar, revelaram-se um desafio e um aprendizado inestimável.

A proposta, portanto, não é apenas apresentar versões, mas compartilhar o processo criativo e reflexivo que envolve a tradução. Afinal, quais ecos do original ressoam em cada versão? Que novas interpretações nascem ao recriarmos imagens e sons em outro idioma?

Convidamos você a ler, comentar e refletir conosco. Qual versão mais se aproxima do espírito do original? Que escolhas poderiam ser diferentes? 

Deixe sua opinião e participe deste diálogo poético nos comentários. Vamos construir juntos um espaço para celebrar a literatura e os desafios da tradução.

 

 

878 fotos e imagens de alta resolução de Paul Auster - Getty Images
Paul Auster [Fonte Getty Images]


Ice – means nothing
Is miracle, if it must
Be what will – you are the means
And the wound – opening
Out of ice, and the cadence through
Blunt Earth, when crows
Come to maraud, Whrever you walk, green
Speaks into you, and holds. Silence
Stands the winter eye to eye
With spring.

 

351 Argentine Jorge Luis Borges Stock Photos, High-Res Pictures, and Images  - Getty Images
Jorge Luis Borges


Inscripción sepulcral

Para mi bisabuelo, el colonel Isidoro Suárez


Dilató su valor sobre los Andes.
Contrastó montañas y ejércitos.
La audacia fue costumbre de su espada.
Impuso en la llanura de Junín
término venturoso a la batalla
y a las lanzas del Perú dio sangre española.
Escribió su censo de hazañas
en prosa rígida como clarines belísonos.
Eligió el honroso destierro.
Ahora es un poco de ceniza y de gloria.

 

TRADUÇÕES POÉTICAS: AUSTER E BORGES


Rogério Rocha

 

Poema de Paul Auster

[Versão 1]


Gelo – nada é por acaso
Se as coisas seguem seu rumo –
És sentido e ferida – aberta
Sobre o gelo, e a cadência pela
Terra bruta, quando os corvos
A vêm saquear. Por onde quer que
Caminhes, o verde, que o envolve,
Também fala em ti. O silêncio põe
O inverno diante da primavera.


[Versão 2]


Gelo – é que nada
É milagre, se tiver de ser
O que será – és o sentido
E a chaga – aberta
Ao frio, e o balanço
Que avança a terra trêmula,
Quando os corvos pousam
Para brilhar. Onde quer
Que caminhes, o verdor
Reverbera em ti, e o abraça.
O silêncio põe face a face
O inverno e a primavera.


[Versão 3]

Gelo significa que nada
É milagre, se está escrito
Que será – dentre caminhos
E estigma – aberto no gelo,
E o equilíbrio sobre a terra
Cega, quando os corvos
Vêm pilhar. Por onde vás,
O verde fala em ti, e o abraça.
O silêncio coloca o inverno
Olhos nos olhos com a primavera.



Poema de Jorge Luis Borges

[Versão 1]

Inscrição Sepulcral
Para meu bisavô, o coronel Isidoro Suárez

Espraiou sua coragem sobre os Andes.
Desafiou montanhas e exércitos.
A ousadia estava inscrita em sua espada.
Na planície de Junín, fincou, vitorioso,
o desfecho da batalha,
sujando de sangue espanhol as lanças do Peru.
Cravou suas proezas
numa prosa grave como clarins em guerra.
Escolheu o exílio honrado.
Agora é um punhado de cinzas e glória.


[Versão 2]

Inscrição Funerária
Ao meu bisavô, coronel Isidoro Suárez

Estendeu seu valor como ponte sobre os Andes.
Confrontou montanhas e exércitos.
A espada era o hábito de sua audácia.
No campo de Junín, selou, triunfante,
o destino da batalha
e banhou em sangue espanhol as lanças peruanas.
Redigiu seus feitos heroicos
numa prosa firme como trombetas de combate.
Preferiu o digno exílio.
Hoje, é resto de cinza e de glória.




Arthur Prazeres

 

Poema de Paul Auster

[Versão 1] 


Gelo — diz-nos nada
É milagre, há de ser
Só o que será — és os plurais
E a lepra — abrindo-se
Em gelo, e através a cadência, pancada da terra, quando corvos
Nos vêm saquear. Por onde caminhes, o verde fala você, por dentro, sustentando-te. Silêncio que estende o inverno, olho a olho,
A desafiar a primavera.
 

[Versão 2]

 

Gelo — significa: nada
É milagre, e o mais
Será como vier — és múltipla como a chaga — quebrando 0 gelo, em cadência própria, Torva terra, quando corvos
Vêm nos fraudar. Aonde quer que caminhes, o verde expressa você, como vértebra. Silêncio
Que abala como o inverno: olho a olho com a primavera.
 

 [Versão 3]

 

Gelo — quer dizer: nada
É milagre, contudo
Será o que há de ser — és vozes
E chagas — florindo
Como o gelo, através da cadência
De morta terra, quando corvos
Nos vêm pilhar. Por onde pises, o verde
Cantará você, ternamente. Silêncio que sustenta o inverno, olho a olho com a primavera.


Poema de Jorge Luis Borges

[Versão 1]


Difundiu seu brio sobre os Andes.

Escalou montanhas e desertos.

Retalhar a ferro foi costume de sua espada.

Impôs nas planícies de Junín

Um final venturoso à batalha

Em que às lanças do Peru deu sangue espanhol.

Escreveu com gana suas façanhas,

Em prosa dura como clarins de guerra.

Escolheu o honroso exílio.

Agora é um punhado de cinzas e glória.


[Versão 2]


Propagou seu valor sobre os Andes.

Subiu montanhas; formou exércitos.

A audácia foi costume de sua espada.

Impôs às terras de Junín

Uma batalha de feliz desfecho,

Às lanças do Peru dando sangue espanhol.

À pena seu senso de façanhas

Escreveu: prosa rígida como bélicos clarins.

Elegeu o honroso desterro.

Agora é como as cinzas e a glória.





quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Homenagem a Jorge Luis Borges



Uma oração
Jorge Luis Borges

Minha boca pronunciou e pronunciará, milhares de vezes e nos dois idiomas que me são íntimos, o pai-nosso, mas só em parte o entendo. Hoje de manhã, dia primeiro de julho de 1969, quero tentar uma oração que seja pessoal, não herdada. Sei que se trata de uma tarefa que exige uma sinceridade mais que humana. É evidente, em primeiro lugar, que me está vedado pedir. Pedir que não anoiteçam meus olhos seria loucura; sei de milhares de pessoas que vêem e que não são particularmente felizes, justas ou sábias. O processo do tempo é uma trama de efeitos e causas, de sorte que pedir qualquer mercê, por ínfima que seja, é pedir que se rompa um elo dessa trama de ferro, é pedir que já se tenha rompido. Ninguém merece tal milagre. Não posso suplicar que meus erros me sejam perdoados; o perdão é um ato alheio e só eu posso salvar-me. O perdão purifica o ofendido, não o ofensor, a quem quase não afeta. A liberdade de meu arbítrio é talvez ilusória, mas posso dar ou sonhar que dou. Posso dar a coragem, que não tenho; posso dar a esperança, que não está em mim; posso ensinar a vontade de aprender o que pouco sei ou entrevejo. Quero ser lembrado menos como poeta que como amigo; que alguém repita uma cadência de Dunbar ou de Frost ou do homem que viu à meia-noite a árvore que sangra, a Cruz, e pense que pela primeira vez a ouviu de meus lábios. O restante não me importa; espero que o esquecimento não demore. Desconhecemos os desígnios do universo, mas sabemos que raciocinar com lucidez e agir com justiça é ajudar esses desígnios, que não nos serão revelados.

Quero morrer completamente; quero morrer com este companheiro, meu corpo.

Jorge Luis Borges
 nasceu em 1899 na cidade de Buenos Aires, capital da Argentina e faleceu em Genebra, no ano de 1986. É considerado o maior poeta argentino de todos os tempos e é, sem dúvida, um dos mais importantes escritores da literatura mundial.

Fonte: Releituras

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