Sem lixo, sem engarrafamentos, com baixo consumo de energia, uso
racional água e interconexão total. Songdo será o canto mais high-tech
do planeta
BBC |
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Songdo, na Coreia do Sul, é um modelo de cidade inteligente |
As ruas de Songdo parecem desertas. Não há muito para se ver
na cidade do futuro no momento, já que ela ainda não está pronta. Mesmo
assim, cerca de 22 mil pessoas já vivem ali, e se espera que mais 5 mil
novos habitantes cheguem até o fim do ano.Quando estiver construída, em
2015, o plano é que Songdo se torne o lar de 65 mil pessoas. Eles
viverão na cidade mais inteligente do planeta – medida não pelo QI dos
habitantes, claro, mas pela tecnologia empregada nos parques, ruas e
prédios. Esta “cidade inteligente” está sendo construída numa área de
aproximadamente seis quilômetros quadrados e seu projeto é extremamente
ambicioso.
Localizada em uma ilha artificial a 56 quilômetros ao
oeste de Seul, na Coreia do Sul, Songdo pretende mostrar para a capital
coreana e para cidades de todos os continentes o que elas podem vir a
ser no futuro. A humanidade precisará de mais cidades inteligentes. A
estimativa das Nações Unidas é de que os centros urbanos serão a moradia
de mais de 70% da população mundial até 2050 – 6,4 bilhões dos 9,3
bilhões de habitantes do planeta. Elas já são o lar de metade dos 7
bilhões de seres humanos, e adicionar mais 3 bilhões de indivíduos a
esse total testará os limites das cidades existentes. A solução, de
acordo com os responsáveis por Songdo, é construir cidades inteligentes,
capazes de dialogar com seus residentes e com o meio ambiente.
Iniciada
em 2000 e com um custo estimado em US$ 35 bilhões, Songdo é o maior
investimento privado do setor imobiliário na história. A maior parte do
dinheiro veio da imobiliária americana Gale International e do banco de
investimentos Morgan Stanley. O dinheiro é, em grande parte, para criar
uma “rede universal” – utilizando a internet para ligar não apenas
pessoas, mas também objetos, casas e carros. Conforme a cidade vem sendo
construída, a gigante das telecomunicações Cisco está instalando
sensores no asfalto, nas ruas e nos edifícios. Cada um destes sensores
enviará dados de forma ininterrupta para um centro de controle, onde
informações a respeito dos prédios, da demanda por energia, das
condições do asfalto e do trânsito, assim como a temperatura externa e
interna, serão coletadas e analisadas.
Cidade pensante
“Estamos
construindo uma cidade que usará informação como combustível. O centro
de controle será o cérebro de Songdo”, explica o CEO da Cisco, John
Chambers. Câmeras de trânsito, por exemplo, vão monitorar quantos
pedestres estão na calçada. Desta forma, para reduzir custos, ruas
vazias poderão ter luzes diminuídas, enquanto as movimentadas terão a
iluminação reforçada. Estresses atípicos também poderão ser detectados
precocemente em ruas ou estruturas, para prevenir atrasos custosos
causados por obras maiores.Outra inovação foi desenhada para evitar
problemas de trânsito enfrentados por todas as cidades. Etiquetas com
identifi cação por radiofrequência (Radio-Frequency Identification, ou R
Fid, na sigla em inglês) serão colocadas em todas as placas de
veículos. Estes aparelhos estão sintonizados em uma frequência
específica e conectados a um processador de baixíssimo consumo. A
etiqueta enviará um sinal se identificando ao controle central. Isso
ocorre em menos de um segundo, e quando todos os carros estiverem dentro
do sistema, um retrato exato do trânsito na cidade poderá ser obtido em
qualquer situação, a qualquer momento. A tecnologia permitirá ao centro
de controle ajustar o intervalo dos semáforos, criar desvios e fornecer
alertas mais cedo. Até mesmo os semáforos terão alta tecnologia, com
lâmpadas incandescentes comuns sendo substituídas pelas LED – que
necessitam de apenas 1% da energia das antigas.O elemento que deverá ter
maior efeito na vida dos moradores, no entanto, será a telepresença. As
telas serão instaladas em todas as casas e escritórios e até mesmo nas
ruas, permitindo às pessoas fazer videochamadas de qualquer local.
Coração verde
A
tecnologia integrada no coração de Songdo é apenas uma parte da
história. O objetivo de uma cidade inteligente é criar algo artificial,
mas também sustentável, com o mínimo de impacto ao meio ambiente.O
recurso natural mais fundamental para seres humanos é a água. Dados de
2006 das Nações Unidas apontam que, em média, moradores de cidades
norte-americanas usam 575 litros de água por dia. Qualquer nova cidade
que surgir vai aumentar o uso global do recurso, mas um desenho
inteligente do terreno, mecanismos de retenção de água da chuva e o
tratamento de água “suja” de pias e máquinas de lavar pratos e roupas
permitirão ao sistema de irrigação de Songdo usar apenas um décimo da
quantidade de água limpa que seria esperada para uma cidade desse porte.
Plantar vegetação no topo dos edifícios reduzirá perda de água da chuva
e combaterá o efeito “ilha de calor” gerado pelas cidades, uma vez que
as plantas absorverão os raios solares e os usarão para fotossíntese,
refrescando o ar em sua volta.
Ainda por cima, Songdo não
precisará de recolhimento de lixo. Um sistema centralizado de coleta,
funcionando por meio de pressão, levará embora os resíduos líquidos e
sólidos, dispensando a necessidade de caminhões com lixeiros circulando
pela cidade. Estas inovações, porém, são o bastante para tornar uma
cidade inteligente? E elas são inéditas? Existem alguns projetos em
andamento em outros locais do mundo. Particularmente na Europa e na
América do Norte, cidades estão integrando tecnologias inteligentes em
suas infraestruturas na forma de redes elétricas que recolhem informação
sobre os consumidores e fornecedores.
A companhia israelense
Innowattech desenhou um sistema de pequenas placas a serem instaladas
embaixo do asfalto, para que, conforme os carros passem, pressionem
estas placas. Elas, por sua vez, convertem as pequenas depressões feitas
no asfalto em eletricidade a ser armazenada em baterias ou enviada de
volta à rede. O sistema também pode calcular se um caminhão está pesando
acima do permitido, e enviar a informação diretamente às autoridades –
utilizando a própria energia gerada pelos veículos infratores para
fazê-lo. A empresa está testando agora se a mesma tecnologia funcionaria
para ferrovias. Enquanto isso, a arquiteta moradora de Buenos Aires
Arianna Callegari desenvolveu uma rede de pequenas turbinas que se
encaixam na parede e no teto de túneis. Estas turbinas geram pequenas
quantidades de eletricidade com o vento resultante da passagem de
caminhões e trens.
O que, afinal, o futuro reserva aos moradores
das cidades? Além da criação de núcleos como Songdo, onde novas
tecnologias são parte do projeto, as cidades existentes podem se tornar
inteligentes?“Existem muitas cidades na Europa – Amsterdã, Barcelona,
Malmö, Estocolmo – que estão apostando nas parcerias com os cidadãos
para se tornarem cidades inteligentes”, diz o chefe do Centro para
Cidades Sustentáveis da Universidade de Napier, em Edimburgo, Mark
Deakin.
Amsterdã, por exemplo, promove a colaboração entre
moradores, empresas e governo para tentar poupar energia, mudando o
comportamento das pessoas e implementando tecnologia inteligente. A
meta, ambiciosa, é reduzir os níveis de gás carbônico para 40% do que
era emitido pela cidade em 1990 até 2025. “De certa forma, melhorar
cidades antigas é como o trabalho de um dentista – é preciso retirar o
que está apodrecendo”, diz Deakin. O presidente da Gale International,
Stan Gale, tem uma visão própria a respeito de como as cidades
inteligentes vão evoluir no futuro. O executivo tem planos de criar 20
novas cidades ao longo da China e da Índia, para as quais Songdo será o
modelo. “Cada uma destas cidades será feita de forma mais rápida, melhor
e mais barata do que a anterior, ano após ano”, diz ele.
Esse
cenário, no entanto, sugere que o rápido avanço tecnológico levará
Songdo a se tornar rapidamente ultrapassada. Nasa, ESA e outras agências
espaciais conhecem bem este problema. Sabendo que a capacidade de
resolver problemas em sondas que deixam a Terra é limitada, estas
agências planejam com antecedência para tornar a tecnologia tão avançada
quanto possível. O trabalho dos arquitetos de Songdo é mais fácil, uma
vez que a tecnologia totalmente integrada pode ser melhorada ou
substituída na Terra sempre que for necessário.Com a população do nosso
planeta em constante crescimento, a criação de cidades inteligentes e a
evolução dos centros urbanos já existentes parecem inevitáveis –
particularmente conforme avançamos para áreas mais inóspitas do globo
terrestre.
Fonte: Revista Conhecer