O morto não veio!
Espera, ó coveiro!
A fraca luz
dos candeeiros
ilumina a madrugada.
Sentado à porta da capela,
fuma seu cigarro
o coveiro.
A noite no cemitério
é profunda,
silenciosa.
Nela, medos primitivos
despertam vozes
e movimentos indecifráveis.
O coveiro, lá sentado,
espera sozinho
o dia romper.
É parte da noite.
Reside em seus segredos.
Espera a chegada
de novo habitante.
Fora, em seus sonhos,
despertado
por homens
que avisavam
da chegada
de um cortejo derradeiro.
À noite, frio cortante
e o piar de corujas.
Sua pá remove,
repetidamente,
camadas de terra
negra.
Negro solo sombrio.
Aberta a cova,
aguarda
o cadáver
que há de chegar.
Horas incólumes
passam,
mas nada.
O morto não veio!
Espera, ó coveiro!
Chega então
um triste homem,
aproximando-se
vagaroso
com dois outros
e anuncia:
- Tua espera acabou!
- Cavastes aqui
tua última morada!
- És tu quem há de partir!
A morte então veio.
Descansa agora, ó coveiro.
Rogério Rocha