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quinta-feira, 28 de julho de 2011

A adesão do Maranhão à Independência do Brasil

Por Rogério Henrique Castro Rocha


 


O dia de hoje, 28 de julho, comemorado como feriado estadual, demarca na história o dia em que, no ano de 1823 - após vários levantes e a oposição de grande resistência - o estado do Maranhão aderiu à Independência do Brasil.

Os questionamentos que proponho que nos façamos aqui são os seguintes: houve mesmo adesão do Maranhão à independência do Brasil? Seria esse o termo mais apropriado para definir o que historicamente ocorreu em nosso estado?

Em primeiro lugar, vale destacar que a assim chamada "adesão" do Maranhão à Independência do Brasil ante Portugal não aconteceu através de um gesto espontâneo. Logo, não se deu de forma livre da parte daqueles que comandavam o estado colonial à época. 

Em segundo lugar, seguindo-se o mesmo raciocínio constante na afirmação inicial, se não houve concordância expressa livremente, não houve, pois, um assentir, ou seja, não houve um consentimento do Maranhão para com o panorama que se configurava ao resto do país.

Isto posto, podemos afirmar que a palavra adesão, em sentido estrito, não é a melhor expressão linguística para dizer o que se passou naquele período da história. Ademais, o que se caracterizou claramente, desde o início, foi, antes de tudo, resistência e oposição (nunca adesão). 

Mesmo porque aderir é uma ação propositiva, concordancial, um ato de assentimento a determinada realidade. E o Maranhão efetivamente não aderiu (e possivelmente demoraria bem mais a aderir) à independência do Brasil em relação à Coroa Portuguesa.

Por isso, em vez de adesão, proponho adotarmos a expressão utilizada por Marcelo Cheche Galves (2011) em seus estudos, e que, ao meu ver, descreve perfeitamente o fenômeno histórico-social analisado, qual seja, o que houve foi a gradativa "incorporação simbólica do Maranhão ao novo corpo político que se delineava". 

Naquelas circunstâncias, portanto, o Maranhão foi incorporado ao movimento de independência (e não aderiu a ele). E mais: essa incorporação não deu-se efetivamente, mas apenas simbolicamente, visto que o sentimento de não pertencer àquele novo quadro situacional permaneceu ainda arraigado na opinião pública maranhense por um tempo considerável.

A título de aprofundamento, aos curiosos, e a fim de buscar entender as razões pelas quais teimava nosso estado em não desvencilhar-se do Estado Português, seria fundamental consultar as fontes documentais existentes no Arquivo Público do Estado do Maranhão, que conserva vários documentos que retratam a situação política da  época, bem como no período pós-independência. 

Recorrendo-se aos documentos (originais e secundários), sobretudo cartas trocadas entre o governo local e as autoridades de dentro e fora do estado colonial português, pode-se perceber de que forma se desenrolaram as lutas e quais interesses estavam subjacentes à posição maranhense.

No Maranhão do início do século XIX as elites agrícolas e pecuaristas eram fortemente ligadas à Metrópole. Naquele período o estado era uma das regiões mais ricas do país, vivendo uma fase de relativa pujança econômica, com a presença de intenso tráfego comercial com os portugueses, além de existirem fortes laços políticos com a Coroa.


Por ocupar uma posição geográfica privilegiada, mais próxima da Europa, o acesso marítimo a Lisboa tornava-se mais facilitado do que com o sul do país, razão pela qual, por exemplo, os filhos dos comerciantes mais prósperos eram, quase sempre, mandados à Europa, muitos deles fazendo todos os seus estudos escolares e universitários em instituições de ensino de Portugal. 

Outro traço que ajuda a contextualizar o que era o Maranhão daquele tempo - e que nos permite entender melhor a razão de sua resistência à ideia de desvincular-se do domínio português - é o de que nossa região era por demais conservadora e, geralmente, avessa às ordens que partiam do Rio de Janeiro, então principal e mais importante cidade do Brasil e centro do poder do Império do Brasil convertido à independência.

O governo provincial pregava a permanência do Maranhão sob o jugo português, posição essa que se reforçava ainda mais ante a quase inexistência, no seio da sociedade maranhense, de oposição à tese. Fato este também firmado no teor das publicações da imprensa da época, principalmente a da cidade de São Luís, que não só sustentava essa visão anti-separatista, como, de parte da opinião pública, diziam seus cidadãos serem "verdadeiros portugueses".

Segundo nos informa o professor Marcelo Galves, para além das motivações de ordem político-ideológicas, 
O que estava mesmo em jogo era a indicação para cargos públicos e a obtenção de privilégios. Na época, São Luís tinha cerca de 30 mil habitantes. A população masculina, adulta e branca, não chegava a quatro mil pessoas. Entre elas estavam os "homens de bem": importantes fazendeiros e comerciantes que tinham relação próxima com o governo provincial, e por vezes chegavam a ocupar cargos públicos. Em sua maioria, eram membros do Corpo de Comércio e Agricultura da cidade. (GALVES, Marcelo Cheche. Independência é traição. Revista de História da Biblioteca Nacional: Rio de Janeiro, 2008.)
Naquele tempo, uma Junta Governativa fiel às ordens vindas de Lisboa controlava a região do vale do rio Itapecuru, onde estava situada a vila de Caxias, uma das principais cidades do estado atualmente. Foi lá, em Caxias, que o major Fidié (João José da Cunha Fidié) e seus comandados resistiram ao avanço das tropas do Império, após a derrota na Batalha do Jenipapo, travada no vizinho estado do Piauí. 

Fidié, após resistir por alguns dias com seus soldados aos ataques das tropas imperiais, situados no morro do Alecrim (parte mais alta da cidade de Caxias), teve que capitular, sendo preso e depois mandado de volta a Portugal, onde foi recebido como herói.

São Luís, como tradicional reduto português que era, foi bloqueada por mar e ameaçada de bombardeio pela esquadra do almirante escocês Thomas Alexander Cochrane (o Lord Cochrane), sendo forçada a aderir à Independência em 28 de julho de 1823. 

No Brasil, mais especificamente, Cochrane foi crucial nos trabalhos prestados ao imperador D. Pedro I, a quem foi indicado por José Bonifácio de Andrada e Silva, então ministro das relações exteriores. Seus valorosos serviços lhe renderam, dentre outras reverências, o título de Marquês do Maranhão. Título que se vê inscrito na lápide do túmulo onde encontra-se enterrado, na Abadia de Westminster, em Londres.

Lord Cochrane foi, por sinal, um personagem importantíssimo nas lutas de independência na América do Sul, tendo participado das campanhas de libertação do Chile e Peru, a pedido destes governos, com feitos memoráveis, tendo sido contratado para ajudar a combater as forças que resistiam aos processos de independência em curso nesses países. 

Um detalhe interessante é que somente em 7 de Agosto de 1823 foi assinado o termo oficial de Adesão do Maranhão à independência brasileira, na Igreja da Matriz, no centro da cidade Caxias. Ou seja, a adesão maranhense como um todo, se levarmos em conta a referência histórica acerca da data de assinatura do citado documento em Caxias, foi, a bem da verdade, ainda mais tardia que a data hoje simbolizada pelo feriado estadual.


Como bem descreve Galves, ilustrando o clima de tensão que viveu nosso estado, afirma que


Em julho de 1823, uma Câmara Geral reunida em São Luís oficializou a "adesão" da província ao Império brasileiro. Após as formalidades que a ocasião ensejava seguiu-se um espinhoso processo de legitimação do novo centro de autoridade na dinâmica política provincial. A "adesão" - resultado do avanço das tropas oriundas do Ceará e Piauí e do desembarque, em São Luís, liderado pelo almirante Cochrane ante a resistência dos "portugueses" da província - deixou marcas profundas. Da Corte, não tardaram a chegar outras medidas de força, como o reenvio de tropas em 1824, a demissão do presidente da província no final do mesmo ano, e a prisão/julgamento, nos tribunais do Rio de Janeiro, de dezenas de envolvidos nos tumultos que agitaram a cena provincial. (2011, p. 106)
Apesar da proclamação da independência do Brasil em relação a Portugal, todo o legado colonial foi mantido sem que houvesse, de fato (mas apenas ao nível simbólico), uma ruptura histórica real para com o status quo ante. Pelo contrário. A escravidão, a monocultura e a monarquia permaneceram, bem como os demais privilégios que gozava a elite ligada ao poder.

Os anos que se seguiram (chegando aos nossos dias) foram ainda bastantes cruéis com o Maranhão, haja vista sua longa história de governos (e desgovernos) oligárquicos, que contribuíram negativamente para o atual momento do estado (e com reflexos decisivos em seu futuro), levando-o a um empobrecimento secular. Legado nefasto que lhe rende, ainda hoje, péssimos indicadores sócio-econômicos dentro do nosso país.


Referências:

GALVES, Marcelo Cherche. "Aderir, "jurar" e "aclamar": o Império no Maranhão (1823-1826). Almanack. Guarulhos, n. 01, p. 105-118, 1º semestre 2011.

http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos/independencia-e-traicao

http://www.maranhaodagente.com.br/adesao-maranhao-independencia-entenda-o-feriado-de-hoje/

http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/lorde_cochrane_marques_maranhao.html

http://cultura.ma.gov.br/portal/sede/index.php?page=noticia_extend&loc=apem&id=13

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